Moradia
Casa de toda a vida
Há 50 anos era iniciada a construção do Conjunto Habitacional Engenheiro João Machado Flores, a Cohabpel
Jerônimo Gonzalez -
“Esse vai ser o meu”, pensava Mariel Moraes, hoje com 83 anos, debruçada na janela de um apartamento do segundo andar, nos momentos finais da construção dos primeiros 29 apartamentos do primeiro plano do Conjunto Habitacional Engenheiro João Machado Fortes, há 50 anos. Imaginava dali o futuro de uma região muito peculiar em Pelotas, os blocos todos parecidos, o comércio de praticamente tudo, o clima quase de cidade própria. Veio o sorteio e, a vida tem dessas, dona Mariel e o marido foram designados ao quarto andar. Ela já havia se resignado, mas, a vida tem dessas também, a escolhida para o apartamento do segundo não desejava nele morar, havia adquirido apenas para revenda, e topou a troca.
A Cohabpel surgiu como projeto em meados de 1960 como uma iniciativa da Cooperativa Habitacional dos Operários de Pelotas. O objetivo era construir apartamentos, de diferentes tamanhos, a serem vendidos principalmente para funcionários públicos, bancários e comerciários via financiamento governamental, sob coordenação do Banco Nacional de Habitação. Os compradores foram se mudando aos poucos, entre 1968 e 1969, e atualmente, no primeiro plano, são 50 blocos, 472 apartamentos e mais de mil moradores. Com o tempo, mais dois planos foram construídos e hoje são 5 mil pessoas instaladas em 1.320 apartamentos.
O casal Alda e Adi Silva - parece que até o nome era sinal de que nunca se separariam - foi o primeiro a ter apartamento determinado, após a realização do sorteio. Hoje com 85 anos, eles se mudaram em 1968, após três décadas de Laranjal, exatamente buscando se estabelecer em área mais central e “acolhedora”. “Gosto daqui porque tem tudo. Dificilmente precisamos sair do condomínio”, comenta a senhora, não sem razão. Se lá no início, há cinco décadas, dona Mariel enxergava um grande nada ao se debruçar na janela do apartamento, hoje, no mesmo local, vê burgos de todas as espécies: supermercado e petshop, academia e açougue, feira e ferragem. Até linha de ônibus foi criada para atender especificamente a localidade.
Neri Gonçalves, 67, é um dos comerciantes que se beneficiam da região. Há pelo menos 20 ele mantém banca na Cohabpel onde vende ambrosia, doces em calda, bolachas. Antes, era funcionário de outro local. Quando surgiu a oportunidade de administrar um espaço próprio, não pensou duas vezes: Cohabpel. “A aceitação do público foi muito grande aqui, então permaneci pela freguesia”, comenta.
Melhorias e trabalho
Boa de morar, a Cohabpel estabeleceu relação de fidelidade com quem a ocupa. Além de Mariel, Alda e Adi, muitos outros também passaram a vida toda naqueles apartamentos e até quem lá morava de aluguel, como Jorge Cabral, 62, decidiu por seguir no condomínio na hora de adquirir espaço próprio.
Esse acompanhamento por décadas exigiu que os três planos se adequassem às necessidades dos agora idosos moradores. No dois e no três, cuja administração é conjunta, foram instaladas rampas de acesso e adquiridas cadeiras de rodas, muletas. São também constantemente são realizadas campanhas de vacinação - na contra a gripe de 2017, o local serviu como único posto volante de Pelotas.
No primeiro houve a instalação, por exemplo, de corrimãos nas escadarias. A atual síndica, Rejane Vilaverde, acrescenta que existe a ideia de contratar um profissional que ministre aulas de exercícios físicos, para deixar a população da Cohabpel mais saudável, além de confortável, por mais 50 anos.
Cuidar
Quando Rejane se mudou para a Cohabpel, era apenas um bebê. Anos depois, já morando em outro espaço, viu surgir a oportunidade de comprar um espaço próprio, ao que não titubeou: voltou para o condomínio onde crescera. Hoje é sindica, já há três anos, e passa as manhãs pensando em melhorias para o local. “Tudo esbarra na falta de dinheiro. Quando assumi, nem mesmo era possível pagar os funcionários. Hoje a situação melhorou, mas ainda temos poucos recursos”, lamenta.
Renato Ribeiro, síndico do segundo plano, está há 25 anos à frente deste cargo que, na maioria das vezes, é temido por quem mora em condomínios. O motivo, ele diz, é o desafio. “Quando assumi a Cohabpel era vista como um cortiço de Pelotas. Fomos mudando isso com muito trabalho”, comenta.
Convivência
Ao mesmo tempo em que foi se tornando um condomínio habitado por pessoas idosas, a Cohabpel também recebeu muitos dos estudantes oriundos de fora de Pelotas que remodelaram a população do município após a adesão do Sisu pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
Segundo a administração do local, hoje é possível dizer que são praticamente divididos em duas metades os moradores: 50% são idosos, os outros são alunos de cursos superiores, atraídos preço do aluguel, um dos mais baixos de Pelotas para o nível. A convivência, todavia, não tem nada de problemática: jovens e idosos dividem experiências em perfeita harmonia - vez ou outra surge um imbróglio, é normal na vida de condômino, mas para esses e outros casos existe estatuto interno e cada morador recebe uma cópia logo ao se mudar.
Primeiro plano
Entregue em 1968
50 blocos
496 apartamentos
Segundo plano
Entregue em 1969
39 blocos
504 apartamentos
Terceiro bloco
Entregue em 1970
20 blocos
320 apartamentos
Total de moradores: 5 mil
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